O menino catava o lixo do mundo.
O menino puxava o carrinho.
O cachorro ia atrás.
Menino juntava garrafa de
plástico. Cachorro, bola furada.
O menino não tinha pai, não
tinha mãe, nem madrinha ele tinha.
Por isso se dizia afilhado da
noite e do dia.
O menino andava sob o sol. O
menino andava sob a lua.
O dia e a noite perguntaram ao
menino:
- Quer andar na claridade ou na
escuridão?
Ele respondeu, guloso:
- Ora na claridade, ora na
escuridão.
O dia e a noite protegia o
menino.
O menino catava carrinho
quebrado largado no caminho.
Catava papelão e com ele fazia
avião.
O menino e o cachorro passeavam
pelas nuvens. O cachorro catava osso de bicho morto. Mas não dava pra comer.
Então, entregava para a terra e ela devolvia margarida.
O menino e cachorro limpavam a
sujeira do mundo.
O menino era pequeno. O cachorro
era pequeno.
O carrinho era enorme.
O cachorro, ora passeava sobre o
carrinho; ora puxava o carrinho com o menino dentro dele.
Encontraram a ovelha com pé
quebrado. Foi para o carrinho.
Encontraram a pomba de asa
torta. Voou para o carrinho.
Cobra sem rabo. Subiu no
carrinho.
O menino encontrou o relógio de
um ponteiro só. Apontava o doze.
Para o menino, o cachorro,
ovelha, pomba e a cobra sem rabo era sempre meio-dia.
Era sempre meia-noite naquele
caminho sem fim.
Eles passeavam e limpavam o
mundo.
Conto publicado na revista Crescer 232 Março 2013
Puxa.. senti uma dorzinho doída no peito pensando nesse menino.. doeu de triste mas doeu de lindo. Fiquei no meio do caminho sem saber se sorria ou chorava.. mas como vontade de ilustrar essa história.
ResponderExcluirObrigada... tenho uma carinho especial pelas histórias dessa coleção, são 4. E que bom esse desejo de ilustra-la, quem sabe não produzimos uma obra juntos, abraço, Cléo
ExcluirCléo: Muito obrigado pelo conto do menino e do cão. Gostaria de partilhar consigo um poema sobre os meninos,da autoria de uma Amiga e Mestre, Maria Beatriz Serpa Branco:
ResponderExcluir"o menino é um recém-chegado de outros mundos.
anunciador de uma distância íntima. de onde nascer
é revelar
sinal de uma viagem a um viver separado.
memória. vaga memória. de brisas além da terra
em mares de aprofundar.
ele é o Anjo enviado de nossos reinos secretos. a este mundo de fora onde depois da infância nos encontrámos habitando. sem saber de outro lugar.
mas o menino é de longe. a Boa Nova soada de praias
além do mar.
rosto voltado aos cantos da distância.
olhos despertos ao acenar do longe.
de onde vieste e ainda te lembras sem saber lembrar?
eco de mundos de silêncio o teu silêncio. menino
de silêncio olhando.
presença de um Real chamando.
além das vozes. das coisas. e dos gestos."
Rui A.
Oi Rui, obrigada pelo retorno e pelo poema sensível e belo da Maria Beatriz, que lindo! abraço, Cléo
ExcluirTambém, lindo! E também senti uma dor no coração por ele...
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