11 de set. de 2010

Tem de quinze? ou a história do leitor montando sua biblioteca.

    A conversa rolava solta com as crianças. Eram pequenas, entre seis e nove anos. Eu oferecia histórias. Algumas inventadas por mim, outras de verdade. Tinha também histórias dos outros, criadas em idos tempos. Elas saboreavam o instante, com aquele jeito assombrado, único das crianças que estão a descobrir coisa nova, e estampavam o olhar maravilhado de quem está se deleitando com a descoberta. Sentadas na beirada das cadeiras, pezinhos balançando, olhos estateladamente brilhantes sobre mim. Uma mão brinca com partes da roupa, agarra-se nas cadeiras quando bate o medo, porque tem disso, conversa para ser boa deve vir recheada de todos os tons: os que fazem rir e chorar; os que despertam o medo, a ternura e a compaixão. Perdidos num tempo mágico, eu e eles, compartilhávamos uma única emoção – aquela que vem com as histórias. E que bom estava sendo. Eu ria com suas carinhas e eles riam da minha. Intenções diferentes movidas pelos mesmos temas.

     Lá pelas tantas o comentário animado de um pequeno, “eu tenho cinco mil livros”... uia... é história pra lá de mil e uma noites. Então vamos. Como nascem as histórias? Como surgiu a história de Pedro e seu recém-inventado Cruzeiro do Sul, com aquela estrelinha a mais, no meio da constelação? E a aventura de Lidia-gata e sua patinha macia roçando o olho, seu pulo elegante ganhando a noite alumiada pelo prata da lua gorducha pendurada no céu? Como se desdobram as noites do também pequeno Bernardo, com seus sonhos coloridos pela coragem e companhia do leão de estimação? Quanta história pra contar! E a minha história de menina construindo mundos inverossímeis acarinhada por mim mesma, na cadeira de balanço da varanda perfumada pelas gloxinias de mamãe?

     Papo vai, papo vem, papo acaba e eu digo, quem tiver livro e quiser autógrafo pode chegar aqui. Abraços, beijos e a voz de um deles. “Quanto custam os livros?” “Ah, cada um tem um preço”, respondo. “Tem de quinze?”, pergunta ele sem titubear. Penso rápido e invento preço para viabilizar o desejo do menino. “Sim, o CD dos monstros custa quinze”. “Então eu quero um”. Entrego o CD para ele e ele me dá duas moedas, uma de dez e outra de cinco. Ele pega suas histórias. Satisfeito abre o sorriso. Afinal serão mais 32 que se juntarão às cinco mil que ele já tem. Olho para as moedas e meus olhos se enchem de lágrimas. Meu pequeno leitor, criança mágica, verdadeira e encantada! As histórias têm seu preço, mas o preço real é a vontade do leitor em estar com elas.

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A fofa do terceiro andar

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