25 de out. de 2010

Eu e o personagem

      Num desses dias de primavera ensolarada de Salvador, minha anja-da-guarda baiana deixou  escorregar uma revelação pra lá de literária, “achei que Cléo Busatto não ficasse triste; que pra ela o sol não parasse de brilhar; que fosse como um dos seus personagens, quando batesse a tristeza pegava o sol e trazia sua luz pra nos fazer rir outra vez. Achei que Cléo Busatto fosse inabalável”.
       Pasma e boquiaberta diante dessa inesperada revelação nada angelical, reivindiquei minha condição de humana e mortal, passível de me jogar no chão e chorar todas as lágrimas, eu que agora nem mesmo podia ser uma personagem de mim mesma. E se naquele momento havia tristeza no peito, ela logo se transformaria numa passageira melancolia, que iria se dissolver num mergulho, quando eu caisse nas águas de Iemanjá. E ela, a anja, ainda completou “até a pouco tempo, Cléo Busatto pra mim era um livro”.
      Bom, querido leitor, estamos falando de uma conversa entre duas mulheres crescidas, esclarecidas, bem formadas (risos...), modernas, independentes, descoladas e lindas, que fazem escolhas e dão conta delas.      
     Mesmo assim, esse diálogo quase surreal, num domingo de sol de derreter os miolos da gente.
     Agora, imagina você, como é esse papo de personagem e gente de verdade, para a criança que ainda não consegue nem mesmo diferenciar a obra do criador; o escritor do escrito. Ser da condição humana passa longe do mundo dos personagens.
     Literatura não é vida de verdade e os personagens que lidam com os aspectos humanos, servem apenas pra mostrar o que nos diferencia uns dos outros e também, como eu posso me resignificar por meio da literatura, ou seja da fantasia.

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