24 de abr. de 2013

Fogo



                               
No início do mundo só havia uma fogueira por toda a terra conhecida pelos Kaingang. Pertencia a Minarã, mas ele não o dividia com ninguém. Um dia o guerreiro Fiietó transformou-se numa gralha branca e partiu em busca do fogo. Tinha um plano. Mergulharia no rio onde se banhava Iaraví, filha de Minarã e esperava ser salvo por ela. Foi bem isso que aconteceu. Ela recolheu o pássaro encharcado e colocou-o para secar junto ao fogo. Deslumbrado com o que viu, Fieetó pegou um tição com o bico e saiu voando. Carregava o fogo pros seus amigos Kaingang. Era um fogo pequeno, pequeno ainda, mas o suficiente para oferecer a eles, luz e calor... [1]

... e assim vai se desenrolando esta narrativa mítica que trata de um tema universal. A conquista do fogo. Este fato foi tão significativo para a humanidade que todos trataram de criar uma história. O fogo foi dotado de sentidos que ultrapassam a dimensão antropológica para adentrar no plano simbólico e nos trazer imagens memoráveis que remetem à iluminação, purificação, transformação e sabedoria.  Nessa perspectiva o fogo se apresenta como uma metáfora para a aquisição do conhecimento e para a ampliação da consciência individual.
Isso tem a ver com a educação. Educar é acender o fogo interior do educando e sensibilizá-lo para que ele o mantenha aceso. E somos nós, artistas e educadores, que devemos manter viva essa imagem, alimentando nosso fogo interno, condição essencial para inflar o fogo do outro e prepará-lo para a conquista de saberes.
Fogo interior é fogo sagrado que mora no coração, e saber comprometido com o coração se torna sabedoria, faz surgir possibilidades criativas e criadoras, gera uma educação orientada para a paz. Este é o verdadeiro poder, porque é orientado pelo conhecimento, que  se adquire lendo, por exemplo. Lendo a mim, ao outro, o que está em torno e lendo o texto. Este é o campo dos domínios da língua e Umberto Eco, escritor italiano, lembra-nos que a literatura mantém a língua em exercício.
Uma das funções da minha vida (casa 10 do zodíaco, o que se deixa para o mundo) é atuar com e para a leitura, principalmente a leitura literária. E vivo me deslumbrando com isso. Como diz a amiga leitora Giselle, você nasceu para brincar de ser vaga-lume e viver assim: acendendo e apagando na mente dos que te leem. Se pego emprestado essa imagem luzidia é porque ela me define. Olho para o conceito e digo a mim mesma, e não é que pode ser isso mesmo?




[1] História do livro Paiquerê, o paraíso dos Kaingang (editora SM), de Cléo Busatto.

2 comentários:

  1. Linda Cléo Busato! Fico muito orgulhosa dessa tua trajetória pelo mundo encantado e revelador das histórias. Também virei contadora de histórias. Claro que vc me conhece! Lá pelos idos dos anos 70 numa agência de atores chamada Galharufas, lembra? Pois é, é de lá que a gente se conhece. Um beijo no seu coração,

    Ah! Postei essa história do seu livro na minha fan page, BEM ESTAR INTEGRAL. Vai lá, se gostar, dá um CURTIR, ficarei imensamente grata!

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  2. Mayara,que boa surpresa, nossa... e veja só, você foi por caminhos tão distintos e bem interessantes... que bom!! Feliz em falar com vc. Vou visitá-la na sua página. Está em São Paulo? Eu, em Curitiba. Beijos

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Oralidade na primeira infância

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